26 de Outubro de 2010
Cavaco recandidata-se e afirma que país estaria pior sem ele
O actual Presidente da República, Cavaco Silva, anunciou a candidatura ao segundo mandato e prometeu uma campanha com menos gastos. Cavaco Silva apontou o desemprego e o endividamento externo como os principais problemas do país e garantiu que Portugal estaria numa situação mais complicada não tivesse sido a sua acção "intensa e ponderada" (...).
Fonte: RTP online
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26 de Novembro de 2005
Cavaco e o Centro/Direita*
QUALQUER que seja o resultado eleitoral das presidenciais, depois de 22 de Janeiro, estará criado o espaço político para a refundação do centro/direita em Portugal.
No "day-after", PPD/PSD e o CDS/PP irão mergulhar numa tremenda crise de identidade. A ironia do destino provém do "Sebastianismo" com que Cavaco Silva se apresenta aos portugueses.
Depois de eleito o novo chefe de Estado, perceber-se-á que afinal, de entre o nevoeiro, o «Messias anunciado» não regressa. A esperança revelar-se-á vã. Quem enfrentar a nebulosa nacional, para ver o que está por detrás do "spleen", irá encontrar um campo vazio. Sem bandeira, sem defuntos e sem heróis. Apenas vazio.
Estará, assim, três décadas depois da fundação dos principais partidos, o campo aberto para a refundação do quadro político-partidário ao centro/direita. Abrindo-se caminho para a criação de uma corrente alternativa e regeneradora deste sistema político, definhado e em fim de ciclo.
Se Cavaco Silva ganhar, o exercício da sua magistratura será "uma pescadinha de rabo na boca". Promete ser um "Presidente activo", como se a sua chegada a Belém significasse um avocar das competências do Governo - que está sustentado no Parlamento por uma maioria absoluta!
A promessa, não passa de uma "blague" eleitoralista, apanhada na primeira curva, quando o mesmo candidato afirma também respeitar integralmente os poderes que a Constituição da República lhe conferem, ser um defensor da estabilidade governativa e escusar-se a avaliar o Governo de José Sócrates, indiciando cautela institucional. Onera-lhe ainda uma frase do seu tempo de coabitação com Mário Soares que soa forte - " O Governo governa, o Presidente preside! ".
Há uma contradição evidente nas duas ideias principais com que se propõe a Belém. O que o tornará um Presidente desconfortavelmente "passivo", refém da ordem constitucional da República (excepção feita ao precedente aberto pelo Presidente Jorge Sampaio) e das posições doutrinárias do partido que liderou.
Ainda assim, Cavaco-Presidente será tentado a "fazer o trapézio", num triângulo com a S. Caetano à Lapa, como, de resto, as posições assumidas por personalidades que lhe são próximas - relativamente ao sentido de voto do PPD/PSD, no último Orçamento de Estado - vêm sugerindo. Cavaco sempre há-de desejar um "longa manus" na direcção do Partido Social-Democrata…
Mas, no final de contas, acabará por actuar como um Presidente deste sistema, agradando ao "establishment" desta III República e asfixiando a afirmação de qualquer líder do PPD/PSD.
Quando aqueles que ao centro/direita defendem a ruptura concluírem que afinal, o "Messias" não vai governar, nem terá condições para dar outro rumo ao país, esses, não se resignarão com a "tutela de Belém" e, reencontrado o seu tempo, vão seguir seu caminho. Constituindo uma alternativa de poder.
E se Cavaco perder? A orfandade seria tal que o terramoto devastaria.
O PPD/PSD, que aposta sem reservas na eleição do seu "salvador da Pátria", entraria em colapso e ver-se-ia obrigado à mais profunda das reflexões. A abertura de um Conclave seria fatal e dramática. Entre os sociais-democratas viria a lume tudo aquilo em que o partido se tornou. Uma organização desajustada, depauperada de quadros capazes e com um cariz acentuadamente "feudal", tal é a pulverização do poder interno. A mediocridade das estruturas, o caciquismo e o desnorte ao nível do pensamento político resultariam numa clivagem irremediável. De um lado, a "ala PSD", aquela que o pior do cavaquismo alimentou - mais subserviente, faminta de aparelho de Estado e situacionista. Do outro, a "ala PPD", aquela que o pior do cavaquismo tratou como bastarda; mais fracturante, patriótica e popular. A “família social-democrata” entraria em processo de cisão.
No CDS/PP, a fractura, já exposta, também seria inevitável. O CDS tornar-se-ia residual e o PP voltaria a emergir.
Deste modo, PPD‘s, PP‘s, outros partidos, movimentos e cidadãos Independentes, que não se revêem nos poderes instalados, vão ter que se entender. Para que possam criar um tronco-comum, com vocação de Governo, devidamente instituído e legitimamente representativo do espaço sociológico do centro/direita português.
Essa corrente inspirar-se-á nas experiências dos Governos AD, bem como numa "correcção genética", que remonta a 1974, à fundação dos velhos PPD e CDS. E na adopção de um programa e regras internas, adequados aos tempos modernos. A aliança assumir-se-á em bloco, com um lastro político definido, reestruturado e apto a apelar a todos quantos, não se identificando com nenhuma força à esquerda, também já não acreditam neste PPD/PSD e neste CDS/PP.
O caminho do centro/direita em Portugal, ao invés do que Cavaco pensa, não será situacionista, antipolítico, ou "peronista". Será inconformado, político e partidário em novos moldes. Pronto para combater a actual decrepitude da III República. No sentido da regeneração da democracia, da garantia das liberdades individuais, do incremento das reformas estruturais na economia, finanças e justiça social, do reforço da autoridade do Estado e da assunção da extensão de Portugal no mundo.
É esta a ironia do destino que Cavaco Silva vem propiciar ao centro/direita português - com ou sem ele em Belém, depressa veremos, com nitidez, um grande campo político. Que está vazio. Haja, pois, quem se predisponha a restaurar a essência da política e a sua dignidade, chamando os portugueses para a missão de retirar o país do torpor em que se encontra.
Trata-se de devolver a Portugal um projecto "de mão cheia". Que jamais poderá perder-se no meio do nevoeiro.
RICARDO ALVES GOMES
* artigo de opinião, publicado na edição do Expresso de 26 de Novembro de 2005