Ninguém sabe qual será o desfecho dos acontecimentos aqui ao lado, em Espanha (a palavra mais procurada nas últimas 24 horas na web, segundo o The New York Times) com epicentro em Madrid. Para já, entre as autoridades e os manifestantes parece haver um compromisso tácito, de não recurso à força, desde que o protesto seja capaz de se auto regular, nos limites do pacifismo e da tolerância. Num primeiro momento, Zapatero, pressentindo o poder da rua e a gravidade da situação, veio acalmar os ânimos, ao dizer que se tivesse 25 anos provavelmente também estaria entre os que clamam por «democracia real, já!». Isto, claro, para que a Puerta del Sol não se tornasse numa Puerta del Infierno.
Importará reflectir sobre isto:
- Independemente das revoltas em vários países árabes, cujas motivações são de outra natureza, note-se, o certo é que também as Instituições Europeias e os (democráticos) poderes soberanos dos Estados estão particularmente vulneráveis, face um descontentamento geral que ganhou consciência da fragilidade da ordem instituída;
- Esta correlação de forças deixou de se medir através do tradicional quadro partidário, assumindo cada vez mais formas inorgânicas;
- Os manifestantes indignam-se e saem à rua para reclamar, mas se os governos não sabem "o que fazer", também eles não sabem bem "como fazer". O que uns e outros sabem é que emprego (mais de 20% de desemprego em Espanha e mais de 12% em Portugal ), habitação e justiça social faltam como pão para a boca.
Donde, tanto lá como por cá, o diagnóstico está feito. Todos sabem aquilo que já não querem e aquilo que querem já. O que falta é "impor-se" alguém, de carne e osso, que saiba derrubar as barreiras entre a política e as pessoas, agregando vontades, dando-lhes sentido, propondo desígnios, e reabilitando a esperança da comunidade para um nova proposta de como fazer, em concreto.
Infelizmente, não foi nada disto que vimos ontem, no debate entre os líderes dos dois maiores partidos portugueses. A porta do sol, em Lisboa, é luz que ainda não se abriu.