É verdade que o «estado de graça» do Governo não durou quatro estações.
Também é verdade que era praticamente impossível ao Executivo não sofrer contestação e desgaste.
Não deixa ainda de ser verdade que a doçura inicial dos media com Passos Coelho já lá vai.
Agora, sendo certo que, só por si, é bastante difícil cumprir o Programa do Governo, leia-se, gerir e honrar os compromissos do Plano de Ajuda Externa, e manter Portugal «à tona da água» no actual quadro da zona euro e da União Europeia requer um esforço descomunal, isso não pode servir de argumento para justificar tudo e mais alguma coisa.
Os membros do governo estão lá, com maior ou menor sentido patriótico, com mais ou menos espírito de missão e de serviço. Mas foram para lá porque quiseram, por vontade própria, em total liberdade. De cada vez que erram, de cada vez que tomam uma decisão polémica, de cada vez que a sua acção é questionável, mal seria da democracia que não pudessem ser interpelados, contrariados e criticados!
O facto de estarmos em «estado de emergência», tanto a nível nacional como europeu (as últimas dão a Grécia praticamente fora do euro e Espanha à beira do resgate total), não pode servir para desculpar tudo a todos o tempo inteiro, oposição incluída.
É claro que os governantes são cidadãos de pleno direito, como os governados, e uma e outra condição jamais pode acrescentar ou diminuir um milímetro aos direitos, liberdades e garantias, para além das prerrogativas especiais que a Lei também prevê, consoante os casos.
Ora, dado por adquirido o que há muito foi conquistado e que importa aperfeiçoar constantemente, é perigoso que entremos na «moda» dos «não-assuntos». Há nesta «tendência» um malefício pior que qualquer tique de autoritarismo: uma certa ideia de impunidade.
Grato, devia estar o Governo aos portugueses, pela capacidade de perceber a gravidade da situação, pelos sacrifícios que têm suportado e pela paz social que têm mantido.
Era bom que alguém soubesse dizer ao Primeiro-Ministro que quando ele vem com a conversa dos «não-assuntos», está a fazer precisamente o contrário do que pretende: atear fogos em vez de os apagar. O pior que pode acontecer ao Governo é convercer-se que, haja o que houver «no pasa nada».