quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

They are watching you


Diz a revista Visão/Expresso que o ex-espião, ex-quadro da Ongoing e ex-maçon, Jorge Silva Carvalho, tinha 4000 contactos no seu telemóvel, com informações, notas e comentários sobre pessoas de toda a espécie, incluindo destacadas figuras públicas, até aos níveis mais altos da hierarquia do Estado, designadamente membros do Governo.

Até aqui, nada demais. Afinal, era espião e larga parte do seu trabalho passava por recolher informações. 
Quantos de nós não conhecemos secretárias com listas intermináveis de contactos e a elas recorremos quando precisamos de falar com fulano, beltrano ou sicrano?

O que esta «bronca» mediática (Impresa v. Ongoing) vem despoletar (para além das questões relacionadas com o funcionamento das «secretas», da segurança colectiva, das alegadas ínvias relações com com grupos de interesses mais ou menos obscuros, e do potencial trafico de influências entre um serviço que deveria estar exclusivamente à mercê do Estado quando, pelos vistos, também é drenado para fins corporativos ou empresariais, como se de milícias privadas se tratasse), para o comum dos cidadãos, é o problema da vulnerabilidade dos registos de dados da  sua esfera privada e da sua violação sem observância dos requisitos legais.

A começar nos supermercados e lojas de pronto-a-vestir (quando nos perguntam se queremos «fazer o cartão»), passando pelos bancos e seguradoras, clínicas e hospitais, call centers e operadoras de telecomunicações, e acabando na infinitude da internet, como é que podemos estar seguros de que os nossos dados e registos não vão ser utilizados para fins diferentes daqueles a que estritamente se destinam?   

Quando, por exemplo, abrimos uma conta numa rede social, quantos de nós lemos as «condições contratuais»,  ficamos cientes da lei que (não) nos protege, e temos fundadas razões para confiar que não vamos ser obervados ilicitamente, ou, pior, caso isso aconteça, achamos que podemos reagir em tempo útil para estancar os danos e ser ressarcidos pelos prejuízos?

Há dias, um assessor de Hillary Clinton dizia que não levará muitos anos para que uma pessoa na idade adulta seja confrontada e tenha de responder por aquilo que disse ou fez na net durante a sua adolescência, numa entrevista de emprego, por exemplo. Aqui a questão já é um pouco lateral. Adiante:

Entre nós, a Lei nº  67/98, de 26 de Outubro, a Lei da Protecção Dados Pessoais, transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Directiva Comunitária n.º 95/46/CE. Regula a protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados. Está agora na forja, não uma Directiva mas um Regulamento Comunitário de Protecção de Dados Pessoais, o qual já não será transposto para a ordem jurídica interna dos Estados-Membros mas terá aplicação directa - vide artigo da advogada Magda Cocco na revista online Advocatus http://www.advocatus.pt/ . A sócia da Vieira de Almeida & Associados chama a 2012, «O Ano da revolução no quadro legal da protecção de dados».

Gostávamos de partilhar do entusiasmo da Dra. Magda quanto à eficácia da legislação que aí vem. Será um passo importante, com certeza. Mas enquanto não virmos o Estado dotado de meios eficazes para actuar e os infractores duramente responsabilizados, acreditamos mais na revista Visão/Expresso que na bondade da norma, nas entidades administrativas www.cnpd.pt/ e nos próprios espiões www.sied.pt/ que, pelos vistos, também precisam de alguém que os espie... apenas o deputado António Filipe mais o PCP não serão, certamente.