Não é de estranhar que os autarcas das localidades onde o Carnaval, sendo um dos maiores cartazes concelhios, também se tornou numa fonte de receitas - como Torres Vedras, Ovar, Mealhada, Loulé ou Funchal, por exemplo - estejam indignados, e não se conformem por este ano o Governo não ter decretado «tolerância de ponto» para o dia de Entrudo.
Já para as terras onde o Carnaval é festejado de forma mais espontânea e menos «comercial», não será tanto assim, pois a mais genuína tradição supera qualquer calendário. Aqui, como noutras tradições...
Quanto ao «resto do País» - os maiores centros urbanos, a começar por Lisboa e Porto - com todo o respeito por quem defenda o contrário, dir-se-ia que tradição, tradição, é mesmo a tolerância de ponto, e a «ponte» a que todos se acostumaram.
Ou seja:
O Carnaval tem arreigadas tradições por todo o Portugal, mas não é uma «festa nacional». Por alguma razão há-de ser que a Terça-feira de Carnaval nunca tenha ganho o estatuto oficial de dia feriado, antes sendo concedida pelos sucessivos governos - o de Cavaco Silva, como todos se lembram, num ano deu-se mal, quando contrariou esse hábito - a tão discutida tolerância de ponto.
Ora, se até aqui a coisa será mais ou menos pacífica e não tem muito que estranhar, o que é verdadeiramente espantoso é vermos destacadas figuras da sociedade portuguesa virem insurgir-se contra o Governo, a começar por Arménio Carlos da CGTP, passando por representantes do patronato, e a acabar em ex ou actuais conselheiros de Estado!
O Governo, ao tomar a decisão de não «dar» tolerância de ponto, não está com isso a «proibir» o Carnaval e, muito menos, a retirar o direito aos portugueses de fazerem os carnavais que bem entendam. Os funcionáros públicos e privados podem festejar depois das horas de serviço e no fim de semana, sendo que, no caso destes últimos, se os patrões também forem «foliões», têm toda a liberdade de dispensar os seus trabalhadores.
O que o Governo, tendo de decidir em função do interesse geral, não pode, de todo, é, num dos momentos mais críticos da vida nacional, num período de assistência financeira externa cujas condições são duríssimas, com credores, mercados e parceiros comunitários a olhar para a Grécia, pensando «Who´s the next one?», dar ares de que, por cá, «o samba é rei». Até porque não é. Somos mais do Fado que do importado...
E para quem achar paralelo possível nas razões da gritaria, entre a tal, da tolerância de ponto negada por Cavaco Silva, quando era Primeiro-Ministro e esta, do Governo de Passos Coelho, sob intervenção da Troika, que se desengane: com os protestos, naquele caso, visava-se deitar o Governo abaixo. Neste, trata-se de atirar Portugal ao chão.