O líder do PS veio insurgir-se contra os nomes indicados para o conselho geral e de supervisão da EDP, reclamando sobre o facto dos comtemplados pertencerem ou estarem ligados aos partidos do Governo, repudiando a promiscuidade entre os negócios e a política, relembrando ainda que Pedro Passos Coelho garantira antes de chegar a Primeiro-Ministro que isso não aconteceria.
À primeira vista, parece tudo bem. Mas independentemente da autenticidade da posição de António José Seguro, o certo é que isso não passa de uma miragem.
Na verdade, a ideia que grassa nos partidos, em especial nos do «bloco central», é que quando se conquista um pedaço de poder, seja lá de que modo fôr, os lugares a distribuir são «coutada» deste ou daquele «clã». Isso começa nas autarquias locais, passa pelas adminstrações regionais, atravessa toda a administração central e propaga-se até à administração indirecta do Estado, ao subsector público empresarial, às embaixadas, aos postos consulares, até às agências externas.
Isto, para não falarmos do modo como são eleitos os titulares dos cargos eleitos, onde, como toda a gente sabe, são os directórios dos aparelhos a indicar os nomes e os chefes a ratificá-los, aqui sim, com influências mais ou menos veladas de organizações terceiras mais ou menos discretas.
Depois, na realidade, o que se passa é isto:
Tomado o poder, divide-se «o bolo» em fatias. Alimentam-se os «salteadores». É costume reservar alguns despojos para os derrotados, pois o sistema é rotativista e, amanhã ,eles usarão da mesma generosidade. Não interessa deixá-los completamente «à míngua». É um «pacto de sobrevivência», tratado nas tais «organizações subterâneas», paralelas ao Estado, onde funciona a lógica da troca de favores, camaradagens e poderes fácticos, à margem dos critérios propagandeados em público.
É por isso que quando ouvimos falar em mérito, isenção, independência ou «interesse público» bastas vezes, isso não passa de conversa «para inglês ver». O exemplo dos concursos públicos para os cargos de chefia na administração pública é flagrante. Acontece que, como ora governa o PS ora governa o PSD, cada um dos partidos vai «metendo os seus» quando está no poder. De cada vez que muda a cor do executivo é então frequente ouvir-se dizer nos Ministérios, «os serviços estão minados». Vai daí, instalada a desconfiança nos serviços, toca a contratar «consultores» para fazerem, em duplicado, tarefas para as quais já estão afectos recursos. Consultores, esses, que por sua vez vão alternando, conforme as ligações que têm. Os casos das sociedades de advogados são flagrantes.
Temos, pois, formalmente, um sistema de administração pública à francesa, e de facto, uma prática «à siciliana».
Talvez fosse preferível assumir-se o «nepotismo». Cai o titular, cai toda a cadeia hierárquica. É eleito novo titular, é nomeada toda a estrutura que dele depende. Os cargos passavam, todos, a ser exercidos em função de um «critério-mor»: o da confiança, logo, todos tinham de ser nomeados.
É claro que existiriam excepções. Casos de pessoas que seriam reconduzidas, não obstante a mudança do titular do cargo. Uns, porque são sempre leais ao «senhor que está no lugar». Outros, porque têm a extraordinária capacidade de «mudar de credo para não mudar de regalias». Outros ainda, porque ou ficam ou levam «os segredos da arca» consigo.
PS e PSD lembram-se de clamar por mais meritocracia de cada vez que estão na oposição. Do que não se lembram, quando estão no governo, é que são os principais responsáveis pelo enterro da democracia em Portugal. Ou, pior: talvez por terem a percepção disso, sabendo que já não há muito para «saquear», pensarão que o melhor é aproveitar para «tratar da vidinha».
PS: não consideramos que os nomes que vieram a público para a EDP sejam de pessoas sem estatura para as tarefas em que vão ser incumbidas. Em grande parte dos casos o problema não está nas figuras de «proa». Quem quiser ver a «massa» de que são feitas as escolhas, que desça um ou dois degraus, e saiba quem são os «colaboradores». A «prova dos 9» faz-se aí.