quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

São "gajos normais"

Há dias, a propósito da romaria de audições parlamentares aos muito ricos do País, pessoa amiga, que observa por seda fina, dizia-me que espantoso é notar a "proximidade" criada entre os comuns deputados e tão gradas figuras. Como se o súbito desnudamento da "classe dos intocáveis" provocasse um estorvo tal aos inquiridores que estes ficassem atordoados ao experimentarem um "diálogo" que jamais imaginaram ter ocasião de aceder.
 
Embora este ângulo, próprio dos privilegiados, não seja o meu, mais afeito, salvo seja, à soberania democrática - porquanto esperava mais "estatura" dos mandatários - o certo é que há um ponto de confluência nas análises: os defeitos, as fraquezas e as misérias humanas não são atributos de uns e imunidades de outros.
 
Uns e outros, aquilo que diferem, indiscriminadamente, é na essência do carácter e na ajuda de cada circunstância para alcançar maior ou menor "reputação".
 
Na banca, o caminho mais curto para a distância entre os degraus é o dinheiro, acompanhado por certos códigos, sobretudo quando há tempo para almofadar e enxertar "pedigree", ou vice-versa. Depois, a História encarrega-se de tudo desfazer um dia, cada qual voltando à sua "insignificância", àquilo que é "normal".
 
Ora, transpondo isto do poder financeiro para o poder político, a diferença está, por um lado, no tempo de carreira, aqui em regra mais breve, nos códigos, actualmente facultativos e muito instantâneos, e na forçosa exposição, mais voraz que qualquer outra.
 
Por outro lado, o caminho mais curto para o palanque é a ausência de escrúpulo, o dinheiro significa pólvora, e aquilo que muitas vezes, erroneamente, se entende por "reputação", é confundido com notoriedade. Todavia, a maior de todas as diferenças está na opinião pública. Na capacidade de mover populações e conduzir pessoas.  
 
Acontece que, tal como estamos a assistir, quem é poderoso, uma vez despojado das armaduras com que se reveste, caso não seja um ser humano extraordinário, passa, num ápice, ao tal juízo do espanto, por se tratar, afinal, de um "gajo normal".
 
Caso a sociedade tivesse isto mais presente, exigia mais daqueles a quem mais é dado. Respeitava mais quem mais merece ser respeitado. Escrutinava mais quem mais deve ser responsabilizado.
 
Também seríamos mais gratos com aqueles que mais são (ou foram) mais capazes de pugnar pelo Bem comum, ao serviço da causa pública ou da iniciativa privada. Isso é que era normal. Seria excepcional.